O que se encontra entre as coisas

Por George Holanda
03/05/2017

 

Andara, o novo trabalho da Cia. de Dança do Teatro Alberto Maranhão e coreografado por Juarez Moniz, é um espetáculo de limiares. Ele se encontra num apertado espaço existentes entre opostos, entre limites. O trabalho se empenha em escavar frestas. Um primeiro exemplo disso é o figurino utilizado pelos bailarinos. Ele tem tons de bege e marrom-claro que nos lembram terra seca, mas as peças possuem uma soltura, um balanço que nos remete ao ar. No meio do caminho, como uma terra que voa por ser levada pelo vento, se encontra Andara.

Os movimentos composto de muitas idas e vindas dos bailarinos, com intensas aproximações e distanciamentos dos seus corpos, além de pausas, constroem um tempo que se descola da realidade, criando uma suspensão do ambiente. Os bailarinos ora parecem ser levados pelo desejo de se aproximar ou se distanciar, ora parecem levados a agir assim por meio de forças outras que não as deles, guiados por um movimento inevitável. E a cada encontro uma suspensão se estabelece, para logo haver uma ruptura. Há uma alternância entre ação e pausa em que uma leva a outra. Os corpos dançam para parar e uma vez parados parecem preenchidos de movimento. E, ainda que o tempo do espetáculo tenha um intencional ralentar, o trabalho não se passa de forma unicamente lenta. Em vários momentos os ritmos dos bailarinos são diversos e talvez por isso não se crie um ambiente artificial, mas de percepção.

A construção desse lugar de suspensão se dá desde o início, quando os quatro integrantes da companhia, com um olhar ora vago ora interiorizado, fitam partes dos próprios corpos ou do ambiente. Não é um olhar que convida, mas também não é um olhar que afasta, é o limiar entre os dois.

O termo andara tem origem tupi-guarani e significa abraço. Ainda que haja muitos atos de abraçar, não parece ser este o tema do trabalho, pois o contato é tão tema quanto o não-contato. O abraço aparece como um dos resultados possíveis dos encontros. Na verdade, se pensarmos que o título do espetáculo no português lembra o verbo andar, talvez este aponte involuntariamente para uma indefinição que está mais no âmago do trabalho.

Andara se encontra entre o real e o onírico, entre a terra e o ar (e a água, presente na trilha sonora pelo som de gotejamento) e entre vários entres. Sem abdicar de um senso de concretude dos corpos constrói uma movimentação que enleva as coisas, numa contemplação que não se perde em si. E, como a iluminação do espetáculo, que em alguns momentos surge vazada, abre frestas antes soterradas.

Ficha Técnica

Direção artística: Wanie Rose

Coreógrafo: Juarez Moniz

Bailarinos: Bruno Borges, Gustavo Santos, Juarez Moniz e Margoth Lima

Figurino: Pablo Ramon

Designer de luz: Ronaldo Costa

Iluminação: Daniel Rocha

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